Vamos analisar as histórias de atletas da NHL que enfrentaram as mais duras contusões e seguiram no gelo
Nos Estados Unidos/Canadá o esporte é dominado por quatro grandes ligas e os fãs vão se revezando durante o ano entre beisebol, basquete, futebol americano e hóquei no gelo. Uma das maiores polêmicas é qual liga é a mais famosa, que carrega mais torcedores, tem o maior apelo de público. Claro que, de acordo com a cidade, um determinado esporte tem uma legião de fãs maior e talvez seja por isso que a discussão entre os fãs da MLB, NBA, NFL e NHL seja eterna.
Mas em outro aspecto, não temos dúvidas. Reunindo as quatro ligas americanas, a NHL tem os jogadores mais durões, sem discussão. São décadas e décadas de exemplos, em que jogadores sofrem contusões das mais sérias, mas sabe-se lá como, conseguem seguir na partida ou retornam ao gelo em tempo recorde. Na última pós-temporada, não foram poucos os casos de jogadores com lesão que jogaram até o limite, como o caso de Erik Karlsson, do Ottawa Senators.
Brendan Shanahan, atual presidente do Toronto Maple Leafs, e ex-jogador da NHL, foi perguntado se hóquei é um jogo duro. A resposta de uma das lendas do esporte foi essa: “Se hóquei é um jogo duro? Eu não sei, você que vai me dizer. Temos que ter a força e potência de um atleta da futebol americano, a resistência de um maratonista e a concentração de um neurocirurgião, enquanto nos movemos em alta velocidade, buscando equilíbrio em finas lâminas sobre o gelo, ao mesmo tempo que existem cinco caras do outro time usando tacos querendo te matar.”
Ainda tem dúvidas? Vamos ver alguns exemplos então. Primeiro voltando quase 30 anos no tempo, temporada 1988-1989. O Buffalo Sabres enfrentava o St. Louis Blues, no dia 22 de março de 1989, e com apenas cinco minutos de jogo, uma disputa pelo puck próximo ao gol dos Sabres, levou a lâmina do patins de Steve Tuttle na garganta do goleiro de Buffalo Clint Malarchuk.
O sangue foi imediato, assustando todos os jogadores no gelo e os fãs presentes. A equipe médica atuou rapidamente e contou com a ajuda de 16 médicos, de várias especialidades, que estavam nas arquibancadas vendo a partida e se prontificaram a ajudar Malarchuk. Foram 300 pontos dados no pescoço do goleiro. Dez dias depois, na última semana da temporada regular, Malarchuk estava defendendo o mesmo gol na partida contra o Quebec Nordiques e participou da campanha dos Sabres na pós-temporada em 89.
Em 2003, jogo 6 da decisão da Stanley Cup entre New Jersey Devils e Anaheim Ducks (ainda usando o logo dos “Super Patos” e comandados pelo já citado aqui Mike Babcock). No segundo período, Scott Stevens acerta Paul Kariya na zona neutra, deixando o craque dos Ducks inconsciente no gelo, sendo retirado para o vestiário imediatamente. Logo depois, Kariya retorna ao banco e faltando dois minutos pro fim do período, o camisa 9 de Anaheim marca o quarto gol do time, para delírio dos fãs na Califórnia. Mike “Doc” Emerik, narrador histórico da NHL, lançou a sensacional frase depois do gol de Kariya: “Off the floor and on the board!!” (“Saiu do chão para entrar no placar”)
Confira a “morte” e o renascimento de Kariya na decisão da Stanley Cup. Sensacional!
https://www.youtube.com/watch?v=w_hV7_XJWuU
Outro caso conhecido envolve uma lenda da NHL. Mario Lemieux, atual dono do Pittsburgh Penguins, era o capitão e maior jogador do time bicampeão em 1991 e 1992. Durante a temporada de 1992-93, Lemieux recebeu um diagnóstico de doença de Hodgkin, um tipo de câncer que ataca o sistema circulatório. Super Mario passou por quimioterapia e radioterapia durante dois meses. No mesmo dia em que fez o último tratamento no hospital, Lemieux pegou um avião para a Philadelphia e jogou contra os Flyers e marcou incríveis 160 pontos naquela temporada, levando o título de maior pontuador.
Podemos enumerar milhares de dentes perdidos em toda a história da NHL. Hoje, todos os 31 times da liga têm seu próprio dentista, que viaja para todos os jogos durante a temporada e sempre com trabalho a fazer. Pernas quebradas e cortes no rosto também são rotineiras dentro da NHL, principalmente na época dos playoffs, quando os jogadores não querem ficar de fora de jeito nenhum.
Claro que todos os demais esportes têm suas lesões sérias e diversas delas já terminaram carreiras pela história. A questão é a vontade incrível dos atletas do hóquei, que não se permitem ficar de fora do gelo. Em 2014, finais da NBA entre San Antonio Spurs e Miami Heat, que tinha LeBron James em seu elenco, um fato inusitado na partida número 1 gerou uma grande controvérsia. A AT&T Arena, em San Antonio, teve um problema com o ar condicionado e o mesmo não funcionou no horário da partida. Com o jogo em junho, verão americano, no Texas, pode-se imaginar o calor que estava dentro da quadra.
Faltando sete minutos pro fim do quarto período, James saiu do jogo com câimbras e culpou o calor. Enquanto diversos atletas apoiaram LeBron, reforçando que as condições eram extremas, uma dupla de estrangeiros dos Spurs disse que não viu nada de mais em jogar sem ar condicionado. O argentino Manu Ginóbili e o francês Tony Parker afirmaram que a partida foi uma lembrança do tempo de Europa, onde a maioria dos ginásios não tem ambiente climatizado e não sentiram grande dificuldades durante o jogo.
Em 1997, um astro da NBA conseguiu vencer as dificuldades e jogar até o fim da partida. Michael Jordan marcou 38 pontos, sofrendo de gastroenterite, desidratação e febre, dando a vitória para o Chicago Bulls no jogo 5 das finais contra o Utah Jazz, colocando a equipe na liderança da série por 3 a 2. Chegando a 39°C de temperatura, Jordan deu um show, vencendo um jogo crucial para a conquista do título.
No beisebol, temos o caso de Curt Schilling, ex-lançador do Boston Red Sox, como um dos mais emblemáticos no esporte. Schilling sofria com dores no tornozelo, que se agravaram durante o começo dos playoffs da MLB. Na decisão da Liga Americana, contra o rival New York Yankees, Schilling passou um procedimento médico bizarro. O tendão do tornozelo se rompeu e o médico da equipe costurou-o por cima da pele, para que houvesse tempo hábil pra Schilling estar na partida. A loucura deu certo, os Red Sox venceram o jogo 6 da série, viraram a decisão e seguiram para a World Series, varrendo o St. Louis Cardinals, conquistando o campeonato da MLB depois de 84 anos. A meia de Schilling, ensopada de sangue, rodou o mundo como um dos maiores sacrifícios feitos por um jogador em campo.
Sabemos que temos “homens de ferro” em todas as ligas, mas na NHL, o número de casos é bem maior e os poucos exemplos que listamos acima ilustram bem como esses jogadores encaram a dor e conseguem seguir atuando mesmo com alguma contusão. A frase “afinal, você é um jogador de hóquei!” é muito usada para relativizar machucados e fazer com que os atletas “se lembrem” o que são e voltem a jogar rapidamente.
Pra finalizar, vamos com mais um caso da NHL. Dezembro de 2009, o New York Islanders viajou até a Philadelphia para enfrentar os Flyers, chegando à noite na cidade para a partida no dia seguinte. No dia do jogo, o defensor Brendan Witt saiu do hotel do time e atravessou a rua, indo para um Starbucks buscar um café. No caminho, foi atingido por uma Yukon, uma caminhonete em alta velocidade. Witt rolou por cima do capô, caindo sobre a calçada. Uma testemunha do acidente que passava por lá, disse que parecia uma cena dos filmes de Clint Eastwood, conhecido no gênero policial e de aventura. O motorista parou para socorrer Witt, que mesmo com contusões e sangramentos, recusou ajuda. Foi ao Starbucks pegar seu café, retornou ao hotel e na mesma noite, jogou 17 minutos na partida, vencida pelos Flyers por 6 a 2.
Com todo respeito às diversas ligas esportivas do mundo, a NHL tem os jogadores mais durões de todo o mundo. Todo o restante, podemos discutir, sem problemas…
Fotos: Reprodução Youtube / Divulgação NBA.com / Ottawa Senators / Boston Bruins / Buffalo Sabres